Para aquelas pessoas que estão sofrendo por assédio moral ou por ventura venham a sofrer aqui tem um resumo muito bom.
O assédio moral no trabalho
O assédio em
local de trabalho
é todo e
qualquer ato abusivo
manifestado através de comportamentos, palavras, gestos,
escritos, que possam trazer danos à personalidade, à identidade ou
à integridade física
e psíquica da
pessoa, colocando o
seu trabalho em risco e destruindo o ambiente de trabalho.
O assédio
no local de
trabalho é uma
conduta muito antiga,
mas só passou
a ser identificado como
um fenômeno destruidor
do ambiente de
trabalho, que atrapalha
a produtividade e causa o absenteísmo, no começo dessa década. De acordo com Hirigoyen (2002), Heinz
Leymann, pesquisador em psicologia do trabalho, que trabalha
na Suécia, há
dez anos atrás
fez uma pesquisa
entre diferentes grupos profissionais sobre esse fenômeno e o
qualificou de "psicoterror".
O assédio no local de
trabalho engloba dois fenômenos, que
são: o abuso de poder e a manipulação perversa.
Esta instala insidiosamente. As
vítimas num primeiro
momento procuram não demonstrar
o sentimento de
ofensa causado por
desavenças ou maus-tratos.
Só que essas
condutas contra elas
vão aumentando e
a vítima vai
se sentindo acuada e
em situação de
inferioridade. Esse processo
faz com que
ela volte para casa diariamente humilhada, exausta e
deprimida. Ela vai perdendo uma parte de si mesmo/a.
Em todo o grupo existem
desavenças e agressões verbais em momentos de estresse ou de mau humor, mas
quando o agressor se acalma, acaba pedindo desculpas ao colega de
trabalho. Só que
na manipulação perversa
as agressões e
humilhações não são reconhecidas pelo agressor, tornando o
fenômeno destruidor para o agredido.
Aqueles que presenciam a conduta
injusta não se manifestam, seja por preguiça, medo (adotando estratégias
coletivas de defesa
ou individuais) ou
egoísmo. O processo
de manipulação perversa só
tende a crescer
se ninguém intervier
de forma incisiva imediatamente. Num momento de crise
acentua-se o que se é. Assim, se uma empresa é rígida, torna-se
mais rígida, se um empregado
é depressivo, torna-se
mais depressivo, um agressivo
torna-se mais agressivo
e assim por
diante. Uma situação
de crise pode levar o indivíduo a dar o melhor de si
para encontrar uma solução, mas uma situação de violência faz com que a vítima
mostre o pior de si, pois tende a anestesiá-la.
O
agressor procura desencadear
ansiedade na vítima,
que faz com
que ela tenha comportamentos defensivos,
desencadeando novas agressões.
Isso acaba gerando sentimentos de fobias recíprocas, a
vítima ao ver o agressor sente medo e ele sente uma raiva fria.
São reflexos condicionados. O
agredido acaba tendo
comportamentos patológicos que acabam
servindo de desculpas
para justificar as
agressões. O objetivo desse fenômeno é transtornar a
vítima, levando-a a cometer erros.
Quando a
agressão é entre
colegas, a empresa
tende a fingir
que não vê
ou, às vezes, nem
toma consciência do
problema, a não
ser que a vítima reaja
de forma ostensiva (chorando ou faltando muito ao
trabalho). A empresa acaba não querendo se intrometer e a
vítima se sente
abandonada. Ela também
se sente enganada
por aqueles que presenciam a agressão e
não intervêm. Quando
se propõe uma
solução, muitas vezes, vai
contra a vontade
da vítima, sendo
a sua transferência
para outro posto
a mais comum. Na maioria das
vezes, as vítimas não são portadoras de patologias, são pessoas que resistem
às agressões, não se deixando
subjugar. É isso
que acaba levando-as
a tornarem-se alvos dos
agressores. Normalmente elas
são pessoas escrupulosas, perfeccionistas, muito
dedicadas ao trabalho.
O
perverso desvaloriza a vítima
e a sua
atitude acaba recebendo
o apoio do
resto do grupo. Isso ajuda a
justificar o comportamento do agressor, levando todos a pensar que o agredido
merece o que está lhe acontecendo.
Durante o
processo de assédio
a vítima é estigmatizada, atribuindo-se
à sua personalidade o
comportamento que na verdade é
decorrente do conflito. Esquece-se o
que ela
era antes ou
como ela é
em outro contexto.
A pessoa que
é acossada dessa maneira não consegue exercer o seu trabalho
direito, tornando-se menos eficiente. Fica fácil demiti-la por incompetência
profissional ou por erro.
De acordo com Hirigoyen:
"O
comportamento de um
grupo não é
a soma dos comportamentos dos indivíduos que
o compõem: o
grupo é uma
entidade nova, que
tem comportamentos próprios. Freud
admite a dissolução
das individualidades na multidão
e nela vê
uma dupla identificação: horizontal,
em relação à
horda (o grupo), e vertical, em
relação ao chefe." (Hirigoyen, 2002, pág. 69)
Os grupos
têm uma tendência
a nivelar os
seus integrantes e
têm dificuldade de conviver com as diferenças. Como exemplos,
há a dificuldade de uma mulher ser aceita em
um grupo de
homens, de um
homem ser aceito
em um grupo
de mulheres, de um
grupo de heterossexuais aceitar a homossexualidade, ou de um grupo aceitar a
diferença racial, religiosa ou social.
O
assédio também pode ser
acarretado por sentimentos de
inveja, quando alguém
tem algo que os outros não têm, como beleza, juventude, riqueza, relações influentes e
etc. Empregados que são
mais qualificados que
os seus superiores
hierárquicos também podem
despertar o assédio dos mesmos.
Inimizades pessoais também
podem despertar esse fenômeno.
O assédio praticado por superior
contra o seu subordinado é o mais comum. Isso ocorre muito no
contexto atual, em
que os assalariados
acreditam que para
manterem seus empregos devem aceitar
tudo.
Primeiro procura-se
tirar o senso
crítico do subordinado,
até que ele
não tenha mais discernimento para
distinguir quem está
com a razão.
Ele é pressionado,
criticado e vigiado
constantemente por seu superior, para que se sinta sem saber como agir, além de
não receber informações
que lhe permitam
compreender o que
acontece em seu trabalho. Esse processo é acentuado pelo
grupo, que se torna testemunha ou até passa a participar ativamente desse
"psicoterror".
O agressor se recusa a mencionar ou discutir o conflito, impedindo
que seja dada uma solução. Não debater a questão é uma forma de dizer ao outro
que ele não lhe interessa, ou que sequer
existe. Como nada
é dito, o
subordinado pode ser incriminado de tudo. Esse
quadro torna-se mais
grave quando a
vítima tem a
tendência de culpar-se, pensando: "O
que foi que
eu fiz a
ele? O que
é que ele
tem a censurar
em mim?" As censuras são vagas ou imprecisas, dando
margem a diversas interpretações por parte da vítima. Isso seria uma forma de
comunicação perversa, que procura impedir o outro de pensar, compreender
e reagir. Muitas
vezes, os agressores
usam discursos paradoxais para evitarem réplicas, como:
"Minha querida, eu gosto muito de você, mas você é uma nulidade!".
As desqualificações se
dão indiretamente, para
que não possibilitem
contestações elas são praticadas
de maneira não-verbal,
através de suspiros,
de erguer os
ombros, de olhares de desprezo,
silêncios, subentendidos como observações desabonadoras. Assim, pode-se levantar
a dúvida sobre
a competência do profissional. A
vítima fica confusa sobre
o que está
acontecendo, sem saber
se está exagerando.
Quando ela tem pouca autoconfiança, a perderá de vez e
desistirá de defender-se.
A
desqualificação também pode
ocorrer através da
evitação de troca
de olhares, de cumprimentos, de
negação da presença
da vítima, não
lhe dirigindo a
palavra ou aproveitando a sua
ausência para lhe fazer pedidos através de bilhetes, ao invés de pedir
pessoalmente. Podem ser feitas também críticas indiretas, dissimuladas em
brincadeiras, sarcasmo, fazendo um
comentário pervertido no
final: "Ah, isso
é uma brincadeira, ninguém vai morrer por causa de
uma brincadeira!".
Uma outra
forma de destruir
psicologicamente um empregado
é isolá-lo do
resto do grupo, impedindo
que ele faça
alianças. Porque quando
uma pessoa está
sozinha fica difícil reagir.
Quando essa iniciativa vem dos colegas, implica em não convidar a vítima para
almoçar, para sair para beber após o expediente, etc. Quando vem dos
superiores, consiste em não
passar as informações
necessárias para que
o trabalhador fique
por dentro do que
está se passando
no trabalho, em
não chamá-lo para
participar das reuniões. Depois a vítima
é deixada de lado e não lhe
passam nada para fazer, mesmo que os
seus colegas estejam sobrecarregados, tornando-a desnecessária. Dessa forma, os
dirigentes se utilizam desse processo para demitir a vítima.
O
processo de assédio
também pode se
dar através da
vexação. Por exemplo,
um trabalhador muito qualificado
pode ser colocado
num cargo bem
abaixo do seu
nível intelectual, ainda por
cima com péssimas
condições de trabalho, como
ter que ficar colando selos em um local
mal-ventilado. Podem também ser passadas tarefas urgentes, quase que
impossíveis de serem
cumpridas, obrigando o
funcionário a permanecer
no trabalho até depois do expediente, a trabalhar nos fins de semana,
para no final ter esse trabalho tão urgente jogado no lixo. Também, podem
ocorrer agressões físicas indiretas, através de negligências, como pedir para a
vítima ou para outra pessoa carregar objetos pesados que caiam, "por
acaso", sobre os pés da vítima.
O
agressor também pode
induzir a vítima
a ter um
comportamento inadequado, como menosprezar ou
provocar uma pessoa
impulsiva levando-a a ter um
comportamento agressivo,
para depois falar:
"Vocês viram, esta
pessoa é completamente
louca! Ela atrapalha o
serviço.".
A
sobrecarga de estresse
pode desencadear erros ou levar o empregado a adoecer físicamente ou
psíquicamente, tendo que tirar licença para tratar da sua saúde.
O
indivíduo perverso, quando
entra em um
grupo, tende a
reunir em volta
de si as pessoas
mais dóceis, seduzindo-as.
Aquele que resiste
à sua sedução
é excluído do grupo, passando a
ser o bode expiatório.
Dessa forma, o
grupo cria um
vínculo social sob a influência
do indivíduo perverso
e a pessoa
isolada passa a
sofrer críticas dos mesmos, através de ironias. O grupo fica
sob influência do perverso, imitando-o em sua falta de respeito e em seu cinismo. De acordo com Hirigoyen,
eles não perdem todo o seu senso
moral, mas ao
tornarem-se dependentes de
um indivíduo sem
escrúpulos, perdem o senso crítico.
Realmente existem indivíduos que sentem
necessidade de uma autoridade superior para chegarem a
um equilíbrio. Os
perversos se aproveitam
da docilidade dessas
pessoas para causar sofrimento aos outros.
A
finalidade de uma
pessoa perversa é
atingir o poder,
não importa de
que forma, ou mascarar
a própria incompetência. Para
isso, ele precisa
se livrar de
todo aquele que represente um obstáculo à sua ascensão.
Ele cria uma fragilidade no outro, para impedi-lo de se defender.
O
medo gera submissão
na vítima da
agressão e também
nos seus colegas,
que presenciam a cena
injusta, permitindo que
ela aconteça. Isso é o
que ocorre no
atual contexto individualista do "cada um por si". As pessoas
têm dificuldade em reagir, com medo
de serem demitidas
ou de virem
a ser estigmatizadas. Nesse
sistema de concorrência desenfreada
a frieza e
a dureza tornam-se
normas. Para continuarem empregados, os trabalhadores
precisam “vestir a camisa da empresa” e não se comportar de forma muito
diferente dos outros.
Quanto mais
desorganizada,
mal-estruturada, ou depressiva
for a empresa,
melhor o perverso vai agir. Será
mais fácil ele achar uma brecha para agir e ampliá-la. A técnica é sempre a
mesma: ele se
aproveita das fraquezas
do outro, fazendo-o
duvidar de si mesmo,
tornando-o incapaz de
defender-se. O agressor
vai agindo insidiosamente, podendo levar
a vítima a
dar razão a
ele, pensando: "Eu
sou nulo, eu
não consigo, eu não estou à altura!". A destruição se
dá de maneira muito sutil.
De acordo com Hirigoyen:
"Dar
queixa é o
único meio de
acabar com esse
psicoterror. Mas é
preciso ter coragem, ou ter
chegado realmente a uma situação-limite, pois isso implica em uma ruptura
definitiva com a
empresa. Além disso,
não há certeza
de que a queixa
será acolhida, nem
que o processo
desencadeado venha a
ter um resultado positivo."
(Hirigoyen, 2002, pág. 93)
Quando os
sintomas do estresse
aparecem, como insônia,
cansaço e irritabilidade, muitas vezes
os assalariados não
aceitam a licença
de trabalho proposta
por seus médicos com medo de
sofrerem represálias quando voltarem.
Apesar de hoje existirem os
Diretores de Recursos Humanos, ainda não é tão valorizado o fator humano nas
empresas e a dimensão psicológica das relações de trabalho.
Então, cabe
aos que têm
poder de decisão,
como os dirigentes
das empresas, os coordenadores, os executivos e etc,
recusar a prática do assédio nas empresas, prezando o respeito
entre os empregados,
ou seja, à
pessoa humana. Os
sindicatos deveriam colocar entre
seus objetivos uma proteção maior contra o assédio moral praticado contra a
pessoa do trabalhador. O assédio não deve ser banalizado por nossa sociedade.
Ele não é uma conseqüência
da crise econômica,
mas é uma
grande restrição do
senso moral dentro do ambiente de
trabalho.
Fonte: Monografia de
final do curso de psicologia da PUC-Rio
As
conseqüências
psicossomáticas das relações
de trabalho na
sociedade contemporânea
Fernanda Fragelli Penna Chaves
Rio de Janeiro, novembro de 2006
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